Há momentos na vida, das pessoas e das instituições, em que o melhor seria sempre estar calado. E mesmo mais que calado: num silêncio sepulcral e sem um ínfimo movimento ou sinal. Pois, foi isto mesmo que não teve lugar por parte de certa loja maçónica, ou, à luz do recurso aflitivo de remendo, por parte de alguns membros da Maçonaria, em face da candidatura do Almirante Henrique de Gouveia e Melo ao Presidente da República.
Perante a tomada de posição dos tais membros da Maçonaria, apenas em seu nome ou no da própria instituição, passou a perceber-se a realíssima posição do nosso militar. Trata-se de uma personalidade conservadora, de Direita, não assumido nestes domínios, e apoiado pela Maçonaria, realidade que se impôs naturalmente, completamente à revelia do que os tais membros da Maçonaria vieram depois tentar explicar, mas de um modo inexplicável.
Hoje, percebe-se já que Henrique de Gouveia e Melo será o candidato da Direita, apoiado pelos eleitores da AD, pelos do Chega, certamente também da IL. Tendo entrado na carreira militar da Marinha em 1979, com uma idade que deveria rondar os 20 anos, Henrique de Gouveia e Melo nunca nada terá tido que ver com a Revolução de 25 de Abril, ou com o seu espírito. O que o marcou, ao tempo, seriam os restos do desagradável PREC, mas por igual a perda das antigas províncias ultramarinas, com a posterior chegada maciça dos nossos concidadãos que viviam naqueles lugares. Entrou na Marinha, pois, ao tempo do nascimento da histórica AD, quando os seus dirigentes apontavam Eanes e Melo Antunes como perigosos comunistas. E viveu mesmo, logo no início da sua carreira na Escola Naval, o atentado de Camarate, que por sorte não foi atribuído ao PCP… Nem a Eanes, Freitas do Amaral ou Balsemão. E terá lido, quase com toda a certeza, as obras dadas à estampa por Augusto Cid. Obras repletas de erros e de raciocínios fora de um mínimo de logica.
Hoje, conhece-se já o que se passou, tanto por via dos trabalhos da Comissão de Inquérito Parlamentar – o Sistema de Justiça teve aqui um terrível falhanço –, mas por igual através d’OS MANDANTES DO ATENTADO DE CAMARATE, do falecido Alexandre Patrício Gouveia. Todavia, será completamente impensável que, numa qualquer circunstância, o nosso militar possa pronunciar-se sobre um crime da maior gravidade e praticado contra a soberania nacional. De resto, ninguém da nossa classe política algum dia se pronunciou sobre os esclarecimentos daquela comissão de inquérito, ou do que se mostra na obra antes referida.
Se se recordar o que se disse sobre as supostas consequências de um apoio do Chega à candidatura de Henrique de Gouveia e Melo, percebe-se o que agora se deu com esta baralhada da Maçonaria: uma espécie de gato escondido com o rabo de fora. E se é verdade que André Ventura percebeu logo que uma vitória de Gouveia e Melo ficaria mais difícil se apoiada pelo Chega, já a Maçonaria esqueceu a má imagem que, por razões histórico-políticas criadas, com ou sem verdade, possui, sendo que o seu apoio a Gouveia e Melo teria sempre ainda piores efeitos sobre a candidatura do militar que, com uma atitude de infantilidade, vieram dizer pretender ver em Belém!!
Tenho para mim que a candidatura há dias revelada por André Ventura tem dois efeitos. Por um lado, retirar da figura de Henrique de Gouveia e Melo o apoio do Chega, que sempre o poderia vir a ferir. Se Gouveia e Melo e André Ventura vierem a chegar a uma segunda volta, sempre o primeiro será o futuro Presidente da República. E mais: pode mesmo, numa tal situação, dar-se uma desistência de André Ventura. Por outro lado, uma candidatura de André Ventura pode aliviar a imagem do almirante, e logo na primeira volta: a uma primeira vista, os objetivos políticos de André Ventura passarão a ser vistos como sendo só deste, deixando o almirante como não estando em tal onda. Um dado é certo: André Ventura não é tolo e se começou por dizer que apoiaria o almirante, é porque as suas posições políticas são muito próximas. Teve de mudar de posição, passando a concorrer ao cargo, a fim de “limpar” o almirante, que é o seu verdadeiro candidato. E como um mal nunca vem só, aí nos surgiu a mais recente barraca com o tal apoio que, sendo inicialmente da Maçonaria, num ápice se está a tentar que seja só de uns quantos maçons… É a tal espécie de gato escondido com o rabo de fora.
Finalmente, a resultante deste conjunto de baralhadas: já não para de dizer-se que Henrique de Gouveia e Melo é da Maçonaria… Sou deste modo obrigado a dar razão ao bispo de Setúbal, Américo Aguiar, que defendeu que sacerdotes e militares devem manter-se exteriores à política. De facto, eu não sei se Gouveia e Melo é maçon, ou não, mas há um dado que sei: ele é já visto como membro da Maçonaria. E daqui retiro esta conclusão, mais que visível: a Maçonaria, mais uma vez, sai-se muito mal com esta mais recente barracada.