Cerca de meia centena de pessoas participou este domingo, em Ponte da Barca, numa marcha de “luto pela democracia” organizada por um grupo de munícipes indignado com o novo regimento da Câmara que consideram ser um documento de “opressão”.
A concentração para o protesto começou pelas 8 horas, junto ao rio Lima, e percorreu a avenida principal da vila até ao edifício da Câmara Municipal de Ponte da Barca, no distrito de Viana do Castelo, onde se celebravam os 508 anos da atribuição do foral às Terras da Nóbrega, por D. Manuel I.
Vestidos de preto, com máscaras pretas e cravos vermelhos nas mãos, os munícipes empunharam cartazes com palavras de ordem como “todos pela liberdade”, “pelo direito de opinião”, “pelas reuniões públicas” e “pelo rigor e transparência”.
Os participantes mantiveram-se em silêncio durante a cerimónia do hastear das bandeiras, e no final, com a participação dos vereadores do PS e da deputada socialista eleita pelo Alto Minho, Sílvia Torres, gritaram “Viva a Liberdade, Viva Ponte da Barca”.
Durante o protesto, que decorreu durante cerca de uma hora, os manifestantes cantaram o hino de Ponte da Barca e Grândola, Vila Morena de José Afonso.
José Machado, da organização, explicou que o objetivo foi “alertar que o movimento agora iniciado não vai parar, até que seja feita a vontade da democracia”.
“Estamos contra o novo regimento da Câmara Municipal que é um regimento de opressão. Contém alíneas como não ser possível uma contrarresposta dos vereadores da oposição ao senhor presidente. Isto não se aplica ao tempo em que vivemos, em pleno século XXI. Saímos à rua, em luto pela democracia, para reclamar pelos nossos direitos”, afirmou o estudante de 20 anos.
Apesar de ter ficado “satisfeito” com a adesão ao protesto, adiantou “que muitas pessoas, alguns funcionários públicos, não participaram por terem medo de sair à rua, por temerem represálias”.
“Muitas pessoas pediram-nos para sairmos à rua por elas porque tinham medo das represálias. Em terra pequena toda a gente se conhece e seria muito provável que alguma coisa lhes acontecesse. Estamos aqui hoje a lutar por eles também”, disse.
“Por não ter crescido em ditadura não quero que volte. Os meus antepassados lutaram para que a democracia prevalecesse. A minha obrigação e a de todos os da minha geração é lutar para que não volte”, insistiu.
À margem das celebrações do Dia do Município, o presidente da Câmara de Ponte da Barca, Augusto Marinho (PSD), reeleito nas autárquicas de setembro, garantiu que o regimento aprovado na primeira reunião camarária do novo mandato “cumpre toda a legislação em vigor” e “não contém nenhuma limitação, nem nenhuma irregularidade”.
“Foi inspirado no regimento da Associação Nacional de Municípios Portugueses (ANMP), que não é uma associação ditadora. É um documento que procura dar mais eficácia às reuniões camarárias e procura responder à resolução dos problemas. É tão somente isto”, assegurou, Augusto Marinho.
O autarca social-democrata disse ter ficado “muito admirado com os fundamentos da manifestação”, referindo que o regimento “foi criado para ajudar, mas foi desvirtuado, criando ruído para continuar a campanha eleitoral”.
“O período eleitoral e de decisão do povo terminou. O povo barquense exprimiu-se de forma democrática, livre, confiou-me a mim a liderança do município e, portanto, agora temos de trabalhar todos juntos e não continuar a criar factos que origem situações menos positivas para Ponte da Barca”, acrescentou.
Garantiu que o regimento “não condiciona a participação das pessoas por implicar uma pré-inscrição indicando o nome, morada e o assunto”, que é para o “próprio benefício do munícipe”, que assim obtém um esclarecimento “mais eficaz”.
“No entanto, isso não impede que um munícipe, no próprio dia da reunião de Câmara, possa ir à sessão e colocar a sua questão. Se calhar não estaremos tão bem preparados para dar resposta cabal”, especificou, o autarca a cumprir o segundo mandato.
Explicou também que com o novo regimento, prevê que na tarde anterior à reunião camarária, os vereadores podem consultar os processos e serem esclarecidos por técnicos municipais.
“A ideia é ajudar ao esclarecimento dos próprios vereadores. Uma coisa é a consulta física dos processos. Outra coisa é a explicação com técnicos que podem dar esclarecimentos adicionais”, apontou.
Lamentou ainda a “dualidade de critérios” da oposição socialista na autarquia, crítica do novo regimento, adiantando que, em 2013, durante um executivo liderado pelo PS, a mesma minuta da ANMP inspirou o regimento municipal”.
Augusto Marinho disse estar “preocupado” com o “extremar” de posições e com a “promoção da instabilidade” no concelho, dizendo que tem sido apelidado, nas redes sociais “de nazista, fascista, com comentários acompanhados por imagens de Hitler, com ameaças de morte”.
“Este tipo de situações contribuem para um clima de conflitualidade baseado em nada. Quem serve a causa pública não tem de estar sujeito a este tipo de achincalhamento. Todos Têm responsabilidade, devem medir as suas ações para que não se cometam estes crimes. Este ‘fait divers’, este mau perder a que se tem assistido, em nada contribui para a imagem de Ponte da Barca”, disse, assegurando que a “democracia nunca esteve em causa” no concelho, e que “sempre” procurou “governar com total abertura, em colaboração de todos, ouvindo a oposição e são as suas propostas”.