As duas cartas da ONU de Guterres
Não fiquei surpreendido com as palavras de António Guterres nesta mais recente sessão do Conselho de Segurança das Nações Unidas. Com elas, Guterres limitou-se a fazer o que é mais simples: bater no ceguinho, como usa dizer-se. Um pouco como um arguente que, certo da valia do doutorando, se vê compelido a também lhe dar uma bola negra, dado que quase todos o haviam já indiciado. De um modo simples: António Guterres fez o mais simples, que foi bater no ceguinho.
Diferente teria sido a situação se o Secretário-Geral das Nações Unidas tivesse chamado a atenção para que as violações da Carta das Nações Unidas são inaceitáveis, seja desta vez, com a invasão da Federação Russa sobre a Ucrânia, seja dos Estados Unidos na Guerra do Iraque, ou no Afeganistão, ou em Granada, ou no Vietname, entre tantos outros casos. De resto, a embaixadora dos Estados Unidos nas Nações Unidas estava ao dobro da distância de Guterres a Lavrov.
António Guterres, objetivamente, não precisou de um ínfimo de coragem, porque esta só lhe seria necessária se
fosse para criticar, à luz da Carta das Nações Unidas, os Estados Unidos, ou o Reino Unido, ou Israel, por exemplo. Simplesmente, Guterres nunca irá por aí. É que as Nações Unidas não são uma estrutura independente dos Estados Unidos, para o que basta olhar, entre tantos outros casos, a recusa de agora dos Estados Unidos em conceder vistos de entrada (nas Nações Unidas) aos jornalistas que iriam cobrir as intervenções de Sergei Lavrov.
O prolongamento, de facto, da censura instituída em Portugal e na União Europeia à RT e à Sputnik. A este propósito, convém chamar aqui a atenção para as palavras de José Azeredo Lopes ao início da noite de hoje, com Júlio Magalhães: referiu que presidências do Conselho de Segurança já existiram com Estados diversos – membros permanentes – e num tempo em que estes estavam a violar a Carta das Nações Unidas. E lego salientou: e nem vale a pena dizer quem foram esses Estados… É fabuloso constatar como O SORRISO DO JAGUAR continua a meter medo a tanta gente. O próprio Papa Francisco, depois de expor que a aproximação da fronteira da OTAN à da Federação Russa talvez tivesse levado a esta invasão, de pronto passou ao silêncio, impiedosamente atacado por Stoltenberg. E o mesmo se repetiu agora com o Presidente Luís Inácio Lula da Silva: depois de expor a verdade, e que é a sua verdade, lá teve que embraiar a marcha-atrás.
O que António Guterres hoje fez foi, afinal, um isomorfismo do que se passou com o Tribunal Penal Internacional, que nunca encontrou nos Estados Unidos, Reino Unido, Israel, França e outros Estados ocidentais razões para que alguém seja pronunciado. Ou antes, a anterior procuradora achou o caminho para seguir em frente – era gambiana –, mas o atual – britânico – mandou logo arquivar o caso. Bom, não eram russos, chineses, cubanos ou não ocidentais. Indubitavelmente, António Guterres limitou-se a fazer o simples, que foi bater no ceguinho.
Recordando velhos instrumentos da Física-Matemática, seguiu o gradiente…