
Na noite de ontem, creio que na RTP 3, já pelo final da sua intervenção, foi possível escutar do causídico Manuel Magalhães e Silva a notícia de que, com mui elevada probabilidade, deverá, num tempo mais ou menos próximo, surgir por aí a substituição do princípio da legalidade pelo da oportunidade em Processo Penal. Bom, fiquei deveras preocupado. E é sobre esta questão que irei agora escrever alguns comentários.
Até hoje, o nosso Processo Penal estipula que o Ministério Público, sempre que toma conhecimento de algum crime passível de ter sido cometido, deverá abrir um processo de investigação. É, dentro do que sei, a observância do princípio da legalidade.
Em contrapartida, se passar a vigorar o princípio da oportunidade, caberá ao Ministério Público decidir do grau de importância dos temas, optando por investigar uns e deixar outros para trás. Bom, trata-se de um terrível risco para o (já baixo) valor da imagem da Justiça em Portugal. E não vale a pena apontar outros Estados onde vigore este princípio, porque nós somos portugueses e temos, por esta razão, caraterísticas que são só nossas.
Com o princípio da legalidade em vigor, como se dá hoje entre nós, todos os casos são sempre tratados, garantindo-se, por este modo, uma forte dose de igualdade dos portugueses perante a intervenção do Sistema de Justiça. Ao contrário, se passar a vigorar o princípio da oportunidade, passa o Ministério Público a decidir sobre quais são as investigações com maior grau de oportunidade. Bom, é simples conjeturar o que ir á dar-se por esta via.
Num ápice, não sendo computadores, os procuradores passam a considerar oportunas as investigações política e partidariamente mais convenientes. É, indubitavelmente, o modo português de estar na vida. Um modo de estar que já levou o Ministro da Educação, Fernando Alexandre, a começar a tratar o caso de se pôr um travão no surgimento de famílias inteiras que fazem carreira académica em certa faculdade, começando no avô e chegando aos netos, porventura aos bisnetos. Convém sempre ter em conta esta realidade: estamos em Portugal…
Por fim, uma outra triste ideia, mas no domínio da Medicina. Há uns mui bons anos, foi Bastonário da Ordem dos Médicos, o académico Germano de Sousa. Pleno de espanto, eis que dele recebi, um dia, esta ideia: o acesso a Medicina deve ser feito pela análise do perfil, e não por via de exames nacionais e no Secundário!!
Nós estamos em Portugal, e logo se percebeu que qualquer filho burro de alguém poderoso no tecido social passaria a dispor do tal perfil, correndo-se o risco de que um jovem inteligente e promissor, mas filho de campónios, de pronto fosse tomado como não tendo o tal perfil. A verdade é que um académico, que era, até, Bastonário da Ordem dos Médicos, conseguiu defender esta inenarrável ideia! Uma média de 10 valores ao longo do Básico e do Secundário nunca viria a impedir o acesso a Medicina, assim o apaniguado fosse percebido como possuindo o tal bom perfil!!! Já o tal jovem filho de campónios, mas com 20 valores ao longo de todo o ensino não superior, bem poderia não prosseguir em Medicina, por, apontadamente, não dispor do tal perfil.
É indubitável que o Sistema de Justiça está hoje muitíssimo mal, com especial relevo para a imagem do Ministério Público. Um dado, porém, é certo: se vier a ser adotado o princípio da oportunidade, aquele sistema irá de mal para muito pior, para mais acompanhado da inevitável desconfiança da generalidade dos portugueses. Portanto, muita atenção: nós somos portugueses e temos caraterísticas que são só nossas e há muito conhecidíssimas…