
Foi com um enorme espanto, que fui encontrar no blogue DUAS OU TRÊS COISAS um post do seu detentor, Francisco Seixas da Costa, ao redor da mais recente moda política: o caso das barracas demolidas em Loures. Bom, fiquei deveras admirado e, com toda a verdade, custou-me bastante ver o referido post. Escreveu Francisco Seixas da Costa:
O Partido Socialista tem de saber dizer, alto e bom som, ao autarca que o representa em Loures que dizer-se socialista não é um rótulo de oportunidade, é a responsabilidade de sempre assumir um comportamento humanista, sem deixar que a ânsia da vitória o arraste na demagogia populista.”
O meu espanto derivou de três fatores. Por um lado, porque o choradinho que se tem vindo a ver em torno desta questão é meramente oportunista. Sobretudo, quando oriundo de militantes com um mínimo de referenciação no seio do PS. Em segundo lugar, porque não faltam situações deste tipo em Portugal, sem que as autoridades governamentais façam o que quer que seja. E, por fim, porque ainda não me dei conta de que nenhuma instituição se tenha adiantado na defesa, concreta e material, do que está em jogo, ou seja, a ausência de habitação digna.
Francisco Seixas da Costa é um concidadão muitíssimo culto, e conhecedor da História de Portugal. Por este facto, sabe ele perfeitamente que Salazar se viu na contingência de ter de manter como permanente o que havia imaginado ser passageiro. E era – não na minha opinião – um ditador. Agora, imagine o leitor como resolveria Salazar a atual crise da habitação… Bom, simplesmente não resolveria. E porquê? Ah, porque nas democracias a que se chegou o poder eleito está incomensuravelmente mais próximo de quem tem real poder, seja do modo que for, do que da enorme maioria das populações, invariavelmente sem meios para responder às suas necessidades essenciais e justíssimas.
Não é José Sócrates que dispõe de dinheiro às pazadas para operar recursos e outros atos judiciais. É, isso sim, a enormíssima maioria dos portugueses que não dispõe de meios para poder recorrer aos tribunais. E quem diz tribunais, diz cuidados de saúde e tudo o mais que é absolutamente essencial a uma vida digna.
Ricardo Leão poderia ter seguido um outro caminho, mas a verdade é que o Governo nada faz para pôr um cobro na vergonha da nossa (dita) democracia, que se materializa nos sem-abrigo por essas cidades dos País. Foi com uma vergonha profunda que senti à saída da récita da JENUFA, em S. Carlos, numa noite de estreia absoluta em Portugal, lado a lado com gente estrangeira, a presença de um conjunto amplo de caixas de cartão, com portugueses dormindo no seu interior, ali mesmo ao lado do Paris em Lisboa. Senti uma vergonha profunda, com todos a observar, em silêncio, aquela mancha de pobreza ao vivo. Bom, nada nos surgiu nos dias imediatos. Nem sequer uma reportagem televisiva de oportunidade partidária.
Infelizmente, dizer-se socialista também não implica que o PS se determine a aprovar o reconhecimento do Estado da Palestina, como há dias se pôde ver na Assembleia da República. Nem implicou, até agora, uma mínima palavra sobre aquele esconder na resolução final, na recente reunião da CPLP, sobre a fome em Gaza.
O que tudo isto me faz lembrar é aquela corridinha dos patriarcas cristãos à tal igreja que foi bombardeada por Israel. A verdade é que nunca lá foram para assistir, ao vivo, aos homicídios, às pazadas, sobre os palestinos. E também não me dei conta, em Portugal, de uma reação mínima à posição de André Ventura sobre que nenhuma mesquita deverá ser construída, no futuro, em Portugal. É a liberdade religiosa, sempre tão badalada pela Direita, Extrema-Direita, católicos e… socialistas. A (dita) democracia está hoje, e por quase toda a parte, transformada numa pândega.