Há já um bom tempo atrás, que sinto ser da ordem dos muitos meses, tomei conhecimento da existência do blogue DUAS OU TRÊS COISAS, do embaixador jubilado Francisco Seixas da Costa. De pronto fui procurá-lo, tendo mesmo proposto a minha participação no blogue, mas tal não foi possível dado que apenas o nosso diplomata ali escreve e há talvez mais de uma década. Em todo o caso, foi um manjar literário que não mais abandonei, tendo mesmo, sempre que surge uma situação adequada, aconselhado o seu acompanhamento. Indiscutivelmente, aprende-se muito por ali.
Ora, num destes dias recentes fui ali encontrar um texto com o título Liberdades, no qual o nosso diplomata salienta que “Estar disponível para discutir a situação internacional, com as ideias próprias, sem ficar minimamente condicionado ou limitado pelos contextos, dá uma imensa sensação de liberdade pessoal.” Bom, é a autêntica realidade. Simplesmente, trata-se de uma realidade estritamente pessoal, porque se o nosso embaixador achasse o contrário do que tem exposto no domínio público, nada de mal lhe acontecendo, também não receberia, quase com toda a certeza, os convites que agora refere.
Quanto à tal empresa multinacional que refere, tenho a maior dificuldade em aceitar que um convite a alguém que pense, sustentadamente, de um modo inverso do nosso diplomata pudesse ter lugar. E então numa estrutura do âmbito da OTAN, bom, é para mim simplesmente inimaginável. Basta recordar o que disse o Papa Francisco, e como Stoltenberg, sem o negar, nos veio com a historieta de que a OTAN é uma estrutura defensiva… Em contrapartida, Francisco Seixas da Costa também irá falar numa estrutura de certo partido profundamente da Esquerda. Não sendo, portanto, o PS, restam o PCP e o Bloco de Esquerda. Simplesmente, são dois partidos distintos, sendo que o Bloco de Esquerda vive muito próximo do apoio à OTAN, apenas com o PCP a ter-se-lhe sempre oposto.
Há muitos anos, nas centenas de noites passadas em casa de certo catedrático de Matemáticas meu amigo, dele fui sucessivamente escutando este aviso, digamos assim: não se iluda, há sempre censura. A verdade é que mantive a minha ilusão por muito tempo. Mas perdi-a aos poucos, tudo culminando no cabal afastamento de José Manuel Barata-Feyo, de Carlos Santos Pereira – teve a coragem de expor, no Jornal das Nove, que tinham sido a Alemanha e o Vaticano os causadores do desmantelamento da antiga Jugoslávia – ou de Manuel Gusmão, entre tantos outros. E ainda não tinha podido ver a proibição do acesso ao sítio da Sputnik, tal como ao da RT. E hoje, com toda a naturalidade, já com a prova assumida do aviso do meu histórico amigo, lá vou vendo o surgimento de programas sobre o Presidente Vladimir Putin, sempre pintando dele o pior, ao mesmo tempo que do Presidente Zelensky nos surgem outros, mas com o que nos dizem ser o melhor.
O que tudo isto me traz ao pensamento é certa passagem de uma entrevista de António Pedro Vasconcelos na GRANDE ENTREVISTA, onde, ao referir-se aos grandes nomes do cinema italiano, os colocou muito acima dos norte-americanos, de pronto dizendo: o problema é que os Estados Unidos têm aquela fantástica máquina de propaganda por todo o mundo. Mas por igual o ensinamento dado aos portugueses na entrevista que [Francisco Seixas da Costa] concedeu a Miguel Sousa Tavares, no noticiário da hora do jantar, ao corroborar o conteúdo da pergunta do Miguel: sim Miguel, mas isso foi sempre assim, há uma lei para os Estados Unidos e outra para os restantes países. Portanto, se há duas leis, porquê estar sempre a apontar o Direito Internacional Público como referência?
Por fim, uma nota que penso ser útil: Francisco Seixas da Costa foi convidado por ser um diplomata sabedor e experiente, mas também porque as suas posições se inserem no pensamento único hoje omnipresente. O mesmo não teria lugar se se tratasse, por exemplo, de João Ferreira. Porque uma coisa é a Guerra do Vietname, ou a do Iraque, ou a invasão de Granada ou do Panamá, ou as ininterruptas violações e crimes de Israel, ou a Estratégia de Tensão da OTAN, na década de 60, outra o que agora se está a passar na Ucrânia. Não consigo acreditar que se tudo o que já se pôde ver desde o passado 24 de fevereiro tivesse os Estados Unidos como protagonista, e não a Rússia, determinasse o que a grande comunicação social vai vendendo ao dia-a-dia. Infelizmente para o Mundo, os atos não valem por si, mas por quem os pratica. Precisamente porque o quadro legal de referência não é único e o mesmo para todos.