Terça-feira, Dezembro 3, 2024

Ano 115- Nº 4979

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Democrata na Casa Branca, guerra no horizonte

É sobejamente conhecido que a presença de democratas no poder norte-americano, com tradição forte, traz guerra no horizonte e a prazo razoável. Pois, aí temos a mais que reconhecida realidade: depois de quatro anos com Trump no poder e sem guerra no mundo, eis que a chegada de Biden, num ápice, criou as bases para que a guerra possa ressurgir.

Nesta situação, de um modo que se não pode discutir com boa-fé, a Rússia de Vladimir Putin tem a mais cabal razão. De resto, a histórica crise dos mísseis de Cuba é suficiente para mostrar o que digo antes. Custa não reconhecer que os Estados Unidos tinham razão na sua exigência de pôr um fim naqueles mísseis soviéticos em Cuba, porque os mesmos punham em grande insegurança a defesa dos Estados Unidos. Hoje, a situação, sendo inversa, é em tudo similar.

Ao expandirem a OTAN para as antigas repúblicas soviéticas, hoje Estados independentes, os Estados Unidos – os Estados Unidos são a OTAN – estão a fazer o que, com razão, criticaram ao redor dos misseis em Cuba: estão a pôr em causa a segurança da Rússia. O problema por detrás desta realidade é também o do azar da antiga União Soviética ter tido um líder sem noção da inexistência do Pai Natal, que foi Gorbachev. Este nosso amigo, hoje completamente fora de um mínimo de consideração interna e internacional, quase desaparecido em tempos de paz, deu-se ao luxo de acreditar na palavra de políticos que chegaram a atraiçoar o seu próprio país, como se deu ao redor dos detidos em Teerão pelo novo regime religioso do tempo. E também os líderes deste novo Estado preferiram os republicanos aos democratas.

Dentro da melhor tradição, os Estados Unidos colocam completamente de lado os europeus, até porque estes continuam a mostrar-se, desde 1945, bons e respeitosos alunos, incapazes de se defenderem e palavrosos quanto chegue. De modo que, sem darem palavra aos europeus, Biden e sua gente determinou-se, de parceria com o Reino Unido de Boris Johnson – um político de grande quilate…–, a evacuar as famílias dos diplomatas que trabalham em Kiev. Aos europeus, naturalmente, sobrou uma saída airosa: Borrell explicou que o ponto de vista europeu não é esse…

Sempre fiéis à liberdade de expressão, os europeus, mormente os alemães, lá viram surgir uma espécie de Humberto Delgado lá do sítio: o vice-almirante Kay-Achim Schoenbach. Deve tratar-se de um militar honrado, com um estigma forte da consciência, ingrediente cada dia mais raro na classe política de hoje. De modo que, em visita à Índia, Kay-Achim Schoenbach afirmou que a Ucrânia não recuperará a península da Crimeia, que a Rússia anexou em 2014. Mas disse mais, este nosso militar da Marinha alemã: é importante ter a Rússia do mesmo lado, contra a China, além de que o Presidente Vladimir Putin, merece respeito.

Como seria de esperar, estas declarações causaram revolta na Ucrânia, que chamou o embaixador alemão para mostrar a sua reprovação, ao mesmo tempo que provocaram consternação e uma rápida repreensão por parte de Berlim. Como se vê, falar claro continua a ser complicado no domínio político democrático, ao contrário do que proclamava, como necessidade, o histórico padre Felicidade Alves. E, como teria de dar-se, Kay-Achim Schoenbach lá teve que se demitir, obrigado, convenientemente, a mostrar-se arrependido…

Por fim, uma palavra para Vladimir Putin: quando se tem razão e se põe em andamento uma estratégia, tem de estar-se preparado para ir até ao fim, podendo correr riscos graves. É aqui que os Estados Unidos se mostram difíceis de bater, porque a violência e a guerra estão-lhes na massa do sangue. Sendo uma sociedade profundamente violenta, fortemente injusta e que levou a guerra, a pobreza e o saque a quase todo o mundo, a verdade é que aquela sua marca fundacional – a da violência – ainda está viva, embora com uma sociedade internamente em decomposição. Pois, se não fosse assim, não existiriam duas Américas no seio da tal dita grande América.

Convém que o leitor se dê conta da real fraqueza da Europa, objetivamente marginalizada pelos Estados Unidos e pelo Reino Unido – e também pela Austrália, como se viu com o caso do abandono dos submarinos franceses –, e mesmo quando é um Boris a desempenhar o cargo de líder do Governo do Reino Unido. Primeiro, o mundo de língua inglesa, só lá para o fim os europeus continentais. E depois, a OTAN, esse braço armado dos Estados Unidos na Europa – por enquanto só na Europa…–, estrutura por cuja pertença cada Estado europeu mostra tanto orgulho…!! De um modo simples: a Rússia tem, desta vez, toda a razão, mas ainda é pouco.

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